quarta-feira, 9 de setembro de 2015

"If there is a light
You can't always see
And there is a world
We can't always be
If there is a dark
Within and without
And there is a light
Don't let it go out"

-U2, Song for Someone

Foto: 8/10/2015

sábado, 5 de setembro de 2015

Fanfic - Cartas para Jane, cap.2

Capítulo II

Assim que terminei de ler a carta, dei-me o direito de relê-la mais duas vezes, tamanha a minha indignação. Era como se um buraco em meu peito fosse preenchido, mas ao mesmo tempo o vazio continuasse. Gostaria de tê-lo ali comigo para responder, em voz alta, a sua carta. Quase sempre, ao contrário do que muitos pensam, as palavras tem mais significado quando ditas, com a devida entonação, do que quando escritas. E esse era um dos momentos em que eu queria dizer-lhe tudo o que sentia, e não escrever-lhe.
Porém, como não havia alternativa, contentei-me em responder a carta, tanto para dizer tudo o que sentia antes de seguir em frente, quanto para amenizar nossos corações.
Sentei-me com muita calma, peguei a pena e o tinteiro, algumas folhas de papel, e comecei a escrever as sentenças, antes que o adeus final fosse dito. Minha letra não saiu como o esperado, mas esse era somente mais um fator para que Lefroy notasse o meu nervosismo e espanto ao receber sua carta.

Steventon, 29 de abril de 1799
Querido Lefroy,
Não costumo escrever muito sobre os meus sentimentos de forma direta, sem me esconder atrás do amor de meus personagens, mas, farei este esforço por você; assim como tenho feito tantas outras coisas por você, desde que nos conhecemos, e assim como fez por mim, arriscando seu casamento ao me enviar aquela carta.
Tudo o que estava escrito me fez chorar, por ser verdade, e sorrir, por saber que você se sente como eu, tem os mesmos arrependimentos, e também pensa numa realidade diferente. Aliás, tudo isso faz o maior sentido, já que você estava completamente certo quando disse que somos um. Fomos um.
Estivemos tão perto da felicidade plena, mas a sacrificamos por algo mais nobre: pela família. Em contradição, não existe nada mais nobre do que o amor, e foi por isso que desisti de nós: por amá-lo, por não suportar a ideia de dormir com você numa cama grande e quente, enquanto a sua família, os que tanto te amam e têm expectativas sobre você, dormiriam em montes de palha organizadas num leito, passariam mais fome, e sentiriam como se fossem esquecidos de Deus, ou pior, do próprio filho.
Toda mulher solteira da minha idade fica sentada esperando que um príncipe encantado com um cavalo branco passe em sua frente, um homem que a faça feliz e que a ame incondicionalmente. Devo dizer-lhe, que graças a você, não preciso mais esperar meu cavaleiro encantado, por que você já ocupou esse papel. Ao contrário do que você imaginava, recusei casar-me com o Sr. Wisley, e assim será com os próximos candidatos que aparecerem em minha vida, a princípio, já que pretendo dedicar-me a escrita, e por me recusar a forçar um casamento em função de dinheiro, por uma convenção social. Mas, por favor, não pense que o que foi dito acima seja uma indireta, já que você realmente tem suas obrigações com seu tio, e eu, felizmente, não as tenho com ninguém. Não tenho o mesmo relacionamento que vocês, de dependência, em relação à renda, e de necessidade, quanto aos seus mais próximos. Por isso, posso manter-me intacta, com esse voto de fidelidade, e com as palavras que ainda irei dizer nesta carta.
Sabe Lefroy, meu coração partiu-se em pedaços quando entrei naquela carruagem, sem devidas despedidas, sem um último beijo, um último toque, com direito apenas de um último olhar, e tenho que admitir, a presença deste vem assombrando meus sonhos todas as noites, quando encosto minha cabeça no travesseiro e penso em tudo, inclusive no nosso passado.
Há algo em seus olhos que me persegue toda vez que fecho os meus. Eu tentei escapar deles mantendo-me acordada por noites seguidas, tentando afastar você da minha mente, mas infelizmente não consigo tirar-lhe dos meus pensamentos. Eu ainda tenho seu rosto pintado em meu coração, rabiscado em minha alma, gravado em minha memória, e eu ainda sinto seus lábios queimando sobre os meus, o toque dos seus dedos, tão profundamente guardados em mim.
Por um lado, é reconfortante saber que não sou a única a se sentir assim, por outro, o sentimento é devastador, como se a saudade me engolisse a cada segundo. Descobri, por fim, um jeito de amenizar esses sentimentos, e como você deve saber, é através da escrita. Estou dando continuidade a um livro que a princípio se chama “Primeiras Impressões”, e admito que o personagem principal, o sr.Darcy, foi inspirado em sua pessoa.
Desejo tornar-lhe consciente o fato de que algum personagem masculino das histórias que ainda pretendo escrever terá um toque “Lefroy”, em algum aspecto, seja no jeito arrogante, presunçoso, e bem aparentado; seja nos olhos azuis, na lealdade, no carisma, na honra ou no amor que sinto.
Impressiono-me como existe uma só palavra para definir tantas coisas, e ao mesmo tempo como existem tantas palavras e mesmo assim, sentimentos indefiníveis. O que passamos se encaixa no segundo caso, com certeza, afinal de contas, mesmo escrevendo tanto, não sei se consegui tornar compreensível  o tamanho da minha felicidade em saber que você continuou sua vida, por que somente assim conseguirei, talvez não de imediato, libertar-me do meu arrependimento, deixando-me imensamente aliviada.  E, antes que me esqueça, muito obrigada pela homenagem quanto ao nome de sua filha. Espero somente que você não faça diferença dela com as outras que ainda estarão por vir, justamente pela história que o nome dessa menina resguarda. Que ela seja eternamente abençoada, e mesmo não a conhecendo, sei das índoles de sua esposa e sei que era fará um bom trabalho com seus filhos.
Antes de receber a sua carta, tenho que admitir, passava horas me torturando com imaginações de como seria seu pedido de casamento à sua esposa. Imagino-o beijando-a e dizendo que a ama, dizendo a ela exatamente as mesmas coisas que você disse a mim. Agora, após seu desabafo, me sinto confortável em saber que você não me esqueceu, e que, felizmente, mesmo com tanto amor destinado à mim em seu coração, que você não parou sua vida. Que, assim como suas esperanças ditas no primeiro parágrafo do que me escreveu, eu não mudei, e sei agora também que você não mudou, mas amadureceu. Isso me conforta tanto que chego a ficar feliz, pois agora meu ego se diz satisfeito em saber que, pelo que disse em sua carta, embora todos os “eu te amo” que você venha dizer a ela, sei que nenhum será igual ao que disse para mim, embora não sejam, de certa forma, mentirosos, quando ditos à sua esposa.
Nunca me esquecerei do que passamos juntos. Daria tudo para reviver aquela despedida na estalagem, e reconstruir aquele momento. Infelizmente, eu novamente me oporia à nossa fuga, mas em compensação, teria lhe dado um último beijo, um último abraço, quem sabe até teria me feito sua, já que essa será, muito provavelmente, a última vez em que nos falamos, uma vez que é melhor não alterar nossa situação atual. Porém, dentre todos os itens que disse que teria feito em nossa despedida, há outro, não citado, que teria feito sem a menor dúvida: dito, do fundo do coração, que eu amo você.
Teria dito que, mesmo pelas circunstancias do destino, mesmo que o tempo passe, mesmo que a idade chegue, mesmo que corram as estações e os anos, que tudo cresça ou morra; aquilo que sentimos um pelo outro não diminuirá, mas por outro lado, também não aumentará. Se manterá sólido, assim, se tornará eterno.
Da sempre sua,
Jane Austen.

Esse foi o último capítulo, espero que tenham gostado. Recomendo o filme "Amor e Inocência", cuja fanfic foi baseada. Obrigado pela leitura!